Já faz um tempo que não consigo entrar na academia de forma "normal", que significa: passo o cartão - a catraca é liberada - eu entro. Agora quando eu passo o cartão, aparece escrito assim: EXAME MÉDICO VENCIDO, e uma sirene soa por toda a academia. Todos me olham, desconfiados. Aí eu tenho que dizer pra moça da recepção:
- Oi, libera aqui pra mim?
- Sim... fala mais...
Mas outro dia uma moça não tão
volúvel bem-humorada estava na recepção, e perguntou:
- Mas por que está bloqueando?- Ah, é que o horário da minha aula é mais tarde, então ela só liberaria depois das sete e meia.... (mentira, mentira).
- Hum, sei. (Se fez de difícil, mas liberou também).
Então vi que isso não ia durar muito, e se descobrissem iriam colocar minha foto no quadro dos alunos mentirosos do mês. Tive que marcar uma consulta pra pegar o bendito atestado, pensando: “Cacete, tenho só 27 anos, porque tenho que ficar levando atestados de seis em seis meses, até parece que iria aparecer uma alteração cardíaca assim, de uma hora pra outra”. É, iria sim. Mas vamos por partes.
Bom, algum tempo depois, entrando no consultório do Dr. Gargamel (seu nome foi alterado para proteger sua identidade).
- Boa tarde Wally (meu nome foi alterado para proteger minha identidade). Então, o que está acontecendo...?
- Nada, só preciso de um atestado porque a academia está pedindo outro (já é a terceira ou quarta vez que vou lá pegar o atestado, e nessa hora ele sempre faz a mesma pergunta).
- Hum... qual academia é?
Nesta hora eu diria o nome, e ele diria “É boa!”. Mas resolvo fazer uma avaliação de mercado das academias da região, pela visão do Clínico Geral.
- Academia B (o nome da academia foi trocado para preservar sua identidade e para evitar merchan gratuito). Mas estou pensando em ir pra C. (faço academia na A).
- É... as duas são boas...
Era o que eu temia.
- ... mas então, como vou te dar o atestado, vamos fazer os testes de rotina né?
- É, lógico. Vai que tem alguém da Polícia Federal ouvindo e te prende por fornecer atestados falsos.
- Hã?
- Nada, nada.
- Huum... pressão 12 por 7. Excelente.
- Oié!
Daí ele começa a auscultar meu coração, e percebo que ele se demora mais que o habitual nesta etapa.
- Quantos anos você tem?
Respondo distraído enquanto tento decifrar o título de um livro que está do outro lado do consultório.
- Vinte e sete.
- Oi??? (tirando o estetoscópio).
- Vinte e sete!!
Escuta mais um pouco, e se afasta.
- Seu coração está com uma batida a mais...
- Pois é, não sei porque eles vivem pedindo esses... como???
- É. Você nunca ouviu essa batida diferente?Ela vem assim, meio fora de hora...
- Hã... então... eu não escuto nem as batidas normais... imagina se escuto essa.
- Olha, foi bem de leve assim... ela apareceu... depois sumiu... mas fiquei esperando, e daí ela voltou!! Bem baixinho, mas voltou!! (todo orgulhoso).
- Uau... não sei quem é o mais malandro, se ela ou você.
- Provavelmente não é nada... mas como o atestado é para praticar exercícios né? (eu não deveria ter falado da Polícia Federal...).
- Hum... e se fosse alguma coisa, o que seria?
- A gente chama essa batida de “Bem-vindo ao mundo de Marlboro”. (o nome do sintoma foi alterado para preservar sua identidade. Na verdade eu esqueci, mas o Google deve saber).
- E ela se deve a?
- Eu vou pedir uns exames...
- Psiu... oi??? (sacudindo o Gargamel pelo jaleco) E O QUE PODE SER ISSO?? Estamos falando da caralha do meu coração né?
- Hum... você fuma? Não tem cara de quem fuma...- De vez em quando. Mas como é a cara de quem fuma?
Nessa hora o Dráuzio Varella entra na sala. Aponta pra mim, joga um cartaz sobre a Lei Antifumo na minha cara, diz “Rarrá!” e sai correndo. Penso em correr atrás, mas vai que meu coração não agüenta...
-
Café?- Não, obrigado. Já tomei um litro hoje.
- Stress?
- Sim, mas só em um dos empregos, o outro é mais tranqüilo.
- Qualquer um destes fatores pode provocar essa batida.- É, mas que tipo de batida era? Um tambor, um bumbo? Tava muito fora do tom? Vai ver que é por isso que eu sempre desafino nos ensaios da banda e... wait!! Eu fiz uma avaliação na academia semana passada... e eles mediram meus batimentos e tal. Fiquei pedalando com duzentos e cinqüenta quilos de carga (divida isso por cem e você terá o valor real) e ela falou que meus batimentos poderiam chegar até 193, mas não chegaram nem a 130. Viu?? Meu coração é o Forrest Gump dos testes ergométricos. Essa batida aí deve ser meu estômago fazendo pipoca.
- Deixa eu ver essa avaliação?Huum... mas não teve eletro... não foi feito por médico.
- Claro que não.
- Ué... foi feito na Academia A. Você não disse...?
- Não, não disse nada. (hehe).
- Bom, mas isso não serve. Isso aqui pra mim é nada.
(grosso!!)- É? Fazer esse “nada” foi mais caro que sua consulta. (olé!!)
- Bom, você vai fazer os exames de sangue de rotina, e já pede o de potássio, e sódio, que regulam os...
- É, eu sei!! Achei que só fosse usar isso em vestibulares. Incrível. Aproveita e pede o de molibdênio também.
- Mas ele não tem a ver com isso.
- Não? E tem a ver com o quê?
- Bem... é...
- Brincadeira. Bom, se não tem jeito né...
E lá se foi nosso herói, com o cartão da Clínica “Cardio-Toma-Bestão” (o nome da clínica foi alterado para... vocês sabem) nas mãos, pensando que isso só deveria acontecer em trinta ou quarenta anos.
Não deve ser nada mesmo. Mas depois eu volto aqui pra dizer os resultados aos milhares de leitores do blog que se preocupam comigo.